segunda-feira, 4 de maio de 2015

BRINQUEDO


Na sua sede de brincar, com os olhos amigavelmente no céu e, hora ou outra, travessos na rua maltratada de sol, ele molhava os lábios rachados de desejo e sorria, como primeiro vento, um pedido à mãe:
- Será que hoje posso brincar de caminhão-pipa?
A mãe consentiu no seu extremo vazio e desânimo. A criança pegou o balde e lhe amarrou a linha e, alígero para dar voo àquele céu sem nuvem e se queimar naquela rua nua, foi cortar sua infância ainda com tão poucas escamas. Voltou após um canto de ocaso da mãe com os olhos cheios de água e boiando alguma solução para seu amanhã.
O caminhão-pipa era sua fonte de diversão momentânea. Nele a criança escoava os seus anos. O cerol do seu dia a dia lhe cortava as asas em pequenas felicidades. A criança, por um tempo, criava sua própria história. A mãe não teria mais porquê chorar, ou até choraria diante de pratos limpos e panelas ferventes.
A sede de brincar permaneceria, mas até quando? O caminhão-pipa, assim como a vida, é temporário. A criança é um brinquedo de água que não se repete.

(VFM)

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