quinta-feira, 15 de março de 2018

VI O SORRISO DA MULHER NEGRA ASSASSINADO


vi o sorriso da mulher negra assassinado.
vi seu rosto negro com marcas da história.
vi o sangue negro levantar sua bandeira
& se afundar & escorrer nas ondas do mar,
pintando a areia branca com sua cor.
vi a rua abatida. vi o carro esburacado.
vi o corpo ofendido, perturbado & morto.
estamos fodidos. estamos cobertos de sangue.
está tudo passado em papel em branco.
a sentença está na cor da pele,
na colorida dor de África. vidas negras importam?
8 ou 9 tiros. pouco importa. os inimigos
tiram vidas, tiram o sono das pobre mães.
querem alvejar os negros. querem cobrir
o negro. a alegria negra. a voz negra.
querem sambar com a injustiça,
dar votos para a comissão de frente
da ditadura, querem cantar o feminicídio,
querem os inimigos aprisionar em
silêncio o grito da revolta.
cria da maré, da rocinha, pavão & pavãozinho,
da quebrada, da favela, querem
cantar as mágoas de março
nos bares chiques do leblon,
querem matar os jovens negros
nos sinais de trânsito & ainda assim
transitar livres pela baía de guanabara.
querem comprar a carne negra nas calçadas,
ricos, brancos, brancos, brancos,
riem das dores do morro,
das causas de março, das negras do mundo.
o homem e o mesmo Rio seguem iguais.
"precisamos gritar para que todos saibam
o está acontecendo em acari nesse momento."
o que está acontecendo com nosso país?
a cidadania está morta. o negro alvo da morte.
os sonhos & planos enchem as praias
de lágrimas. uma mulher negra passa
vendendo suas lágrimas. é sacolé,
é biscoito, mas no fundo o que o inimigo
quer é o mate. mate. mate. mate.
a família negra treme em seu pequeno barraco.
é chuva, é vento, é frio, é o tiro, o murro,
que sacode a casa, que fratura os ossos
& desperta a criança negra do seu sono de fome.
o inimigo quer entrar. você sabe do que ele é capaz.
o negro sabe do mundo. o pobre sabe da dor.
a favela não sabe seu nome, muitas vezes
visitada por balas e turistas.
o coração do negro pulsa, o do inimigo bate,
espanca, assassina, cala o surdo chamado.
o inimigo persegue incansavelmente,
golpeando os direitos, golpeando a mulher negra
mesmo essa liquidada no beco de suas tristezas.
está na hora de perseguirmos os inimigos,
apesar de sua potência de fogo, sua proteção
da gravata, do seu colete de toga.
o inimigo não quer desaparecer.
a mulher negra está na luta para não
desaparecer. ela suporta a dor de anos,
escrava dos homens, escrava do tempo.
não fique quieta, não fiquemos quietos.
a raça negra, negra como a noite
não deve se esconder atrás das
estrelas, do branco carregado de vaidade.
mulher, mulher, mulher.
vi seu sorriso assassinado.
vi suas mãos de luta alimentar seus filhos.
vi seu coração largado
no céu escuro. pobre negra, negra pobre.
querem colocar no ar mais uma série
da barbárie. querem fazer uma minissérie
das suas angústias para o inimigo
ganhar mais propaganda & ibope.
querem dar um emprego para lavar o branco.
vão assim, mulheres negras, morrendo
aos poucos & outras vão morrendo mais.
a morte está vestida de branco.
mulher negra, o terreiro te canta.
iansã, ewá, nanã, oxalá!
há guerras dentro da mulher negra,
ao redor da mulher negra,
e morre a mulher negra.
mais um nome sangra na história branca.
não podemos deixar em brancas nuvens.
os inimigos têm de pagar.
luto e luta fazem o seu corpo.
vocês são presentes. vocês estão presentes.
não se deixem calar.
vi o sorriso da mulher negra assassinado.
é um recado violento. é uma ameaça. é um genocídio.
é mais uma arma na cabeça de todos nós.

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